sexta-feira, 25 de abril de 2008

A summis labris.


Então, já que ando bem literata ultimamente, resolvi colocar aqui algo da minha musa MOR. Estou no clima de obscenidades apaixonadas. Espero que aproveitem.
;)


Do desejo

Quem és? Perguntei ao desejo.
Respondeu: lava. Depois pó. Depois nada.

I

Porque há desejo em mim, é tudo cintilância.
Antes, o cotidiano era um pensar de alturas
Buscando Aquele Ouro decantado
Surdo à minha humana ladradura.
Visgo e suor, pois nunca se faziam.
Hoje, de carne e osso, laborioso, lascivo
Tomas-me o corpo. E que descanso me dás
Depois das lidas. Sonhei penhascos
Quando não havia jardim aqui ao lado.
Pensei subidas onde não havia rastros.
Extasiada, fodo contigo
Ao invés de ganir diante do Nada.


II


Ver-te. Tocar-te. Que fulgor de máscaras.
Que desenhos e rictus na tua cara
Como os frisos veementes dos tapetes antigos.
Que sombrio te tornas se repito
O sinuoso caminho que persigo: um desejo
Sem dono, um adorar-te vívido mas livre.
E que escura me faço se abocanhas de mim
Palavras e resíduos. Me vêm fomes
Agonias de grandes espessuras, embaçadas luas
Facas, tempestade. Ver-te. Tocar-te.
Cordura.
Crueldade.


III


Colada à tua boca a minha desordem.
O meu vasto querer.
O incompassível se fazendo ordem.
Colada à tua boca, mas descomedida
Árdua
Construtor de ilusões examino-te sôfrega
Como se fosses morrer colado à minha boca.
Como se fosses nascer
E tu fosses o dia magnânimo
Eu te sorvo extremada à luz do amanhecer.

[...]

IX


E por que haverias de querer minha alma
Na tua cama?
Disse palavras líquidas, deleitosas, ásperar
Obscenas, porque era assim que gostávamos.
Mas não menti gozo prazer lascívia
Nem omiti que a alma está além, buscando
Aquele Outro. E te repito: por que haverias
De querer minha alma na tua cama?
Jubila-te da memória de coitos e de acertos.
Ou tenta-me de novo. Obriga-me.

X


Pulsas como se fossem de carne as borboletas
E o que vem a ser isso? perguntas.
Digo que assim há de começar o meu poema.
Então te queixas que nunca estou contigo
Que de improviso lanço versos ao ar
Ou falo de pinheiros escoceses, aqueles
Que apetecia Talleyrand cuidar.
Ou ainda quando grito ou desfaleço
Adivinhas sorrisos, códigos, coluios

Pois pode ser.
Para pensar o Outro, eu deliro ou versejo.
Pensá-LO é gozo. Então não sabes? INCORPÓREO
É O DESEJO.


HILST, Hilda. Do desejo. São Paulo: Globo, 2004.

3 comentários:

ana disse...

Face melhor que n'O Caderno Rosa de Lori Lamby. Pra mim, é claro. Me trouxe mais calma que intensidade. Trouxe tanta calma.

"Nem omiti que a alma está além, buscando
Aquele Outro"

Anônimo disse...

Blog novo sobre música.
Dá uma passada lá, e se gostar, dá uma força ;D

Beijão

Lorena Martins Lisboa disse...

nossa!
liiindas as fotos!