terça-feira, 16 de outubro de 2007

A pedidos e por não conseguir calar: a elite.


No furor pós-cinema, venho escrever - na verdade, logorrear - a minha humilde opinião sobre "Tropa de Elite". Eu ainda não havia assistido, como a maioria das pessoas já o havia feito. Mas não por ser contra a pirataria (o que pode mostrar-se contraditório à minha opinião contida neste texto), mas sim porque só possuo mídia que roda no computador, e convenhamos, monitor de p.c. cansa. Então, vamos lá.

Primeiro e mais merecido elogio é ao ator bahiano Wagner Moura. Se eu já me encontrava apaixonada por sua atuação como Olavo (na última novela global das 21h, Paraíso Tropical), capitão Nascimento fechou meu coração com a faca na caveira. A entrega à personagem é tão intensa que Moura confunde-se - e confunde-lhe - por várias vezes. Atordoado, as arritmias cardíacas acabam por contagiar quem assiste. Pulsamos junto à ele, subindo o morro, gritando trinta palavrões para uma palavra, pedindo a "12" para ver a cabeça explodir e dar ao repugnante, digno funeral.

O maior mérito deste filme, para mim, não é mostrar alto nível de sangramentos, espancamentos, torturas... É dar um sacode em nossas cabeças pra lembrar que as coisas andam muito erradas, meu amigo. E não só ali, no contingente polícia-morro-tráfico, mas em todos os âmbitos sociais. A responsabilidade é sua, é minha, é de todos, de forma igual. Se existe alguém que passa fome, sim, tenho parcela de culpabilidade. Se existe um policial corrupto, é porque eu permito. Se existem as cotas universitárias, é porque eu tenho dívida histórica com essa parcela da população. E SIM, todos nós temos que pagar por esse preço. Achei a tirada perfeita, a discussão em sala de aula sobre a Polícia Militar abordada no filme. A hipocrisia que ronda os territórios pseudo-intelectuais brasileiros, chega a ser digno de nojo. Principalmente nas universidades federais, onde deveríamos ter pessoas socialmente responsáveis e conscientes (com todo o trocadilho que tenho direito). Isentar-se de compromisso e vitimizar-se é de praxe. E sem alguma vergonha, o que tem sido pior.

Todo o trâmite das pequenas corrupções, no fim, engajam-se neste gigantesco e cruel sistema resultante como pressionador de todas as camadas sociais. Algumas, pagam um preço maior. Infelizmente, as que não têm muita escolha em qual lado podem jogar. Têm que dançar conforme a música. E não estou dizendo das pessoas que partem para o tráfico porque não tem oportunidades. E sim das que, de uma forma ou de outra, estão lá, a mercê de tiros na cabeça, porque não lhes foi perguntado pra onde a vida ela queria levar. Mas este sistema NÃO é um ser superior dado do além acima dos pobres seres humanos. As pessoas se esquecem facilmente - e lhes é mais adaptavelmente confortável - de que TUDO é responsabilidade da suposta "racionalidade" que nos difere (?) do resto dos animais habitantes do planeta. O que é deixado pra trás neste não-pensamento, é na verdade, o essencial.

Voltar para a cama quentinha & limpinha hoje, dói muito, mas é inegável que este sentimento de dor irá apaziguar-se com o sono. EU, irei dormir. Por aqui, nada de tiros ensurdecedores, nada de foguetes, nada de gritarias, nada de sangue, nada de arrombamentos e tapas na cabeça. Isso tudo ecoa fortemente na cabeça, mas no pensar é extremamente fácil de lidar com essa dor, entende? Pretendo não deixar morrer este grito, este sufoco. Há tempos quero continuar a tornar-me diferente. E é preciso. Não irei tatuar uma caveira com a faca no meu peito, mas posso e você pode também, marcar isso em seu coração. Levantar todos os dias com a certeza de que não podemos esperar que as pessoas façam algo. As pessoas, meu caro, estão todas em você.

O mais importante é ser humano justo, descente. Ser esperto é o caminho mais fácil, mais glorioso, e pode sim, ser o mais duradouro. No entanto, a esperteza leva a abismos sem volta. Não irei criticar nenhuma classe social específica, todos errados, cada um com sua justificativa de tempo/espaço. Meu recado é: constrói-te uma pessoa funcionalmente descente à sociedade. Falta-nos brio, falta-nos coragem. Talvez, o direito à vida fosse necessário ser concedido somente após uns bons tapas na cara aos berros de: "zeroum, você não tem coragem de viver, desista!"

E aí, é com você. Vai ser: "Desisto, senhor!" ou "Sim, senhor"?


Site oficial do filme
Blog Wagner Moura

8 comentários:

Anônimo disse...

Eu queria ver no cinema, parece que tem cenas cortadas ao inves de ser maior como falaram. Mas queria ver, mas como todos os filmes legais que lançam eu sempre falo que vou ver e nunca saio de casa pra isso, como se o cinema fosse muito longe daqui.

E Paula, você é meu ídolo por conseguir escrever tanto. Vou linkar no liquidificapum! x]

=**********

ana disse...

Eu vi o pirata numa aula de Personalidade. Ainda tive que discorrer sobre relação de poder em Foucault e os conceitos de subjetividade, identidade e personalidade. Mas que beleza!

Quanto ao sacode, não senti muito isso. Talvez por haver um narrador, o que já te dá um ponto de vista redondinho e facilmente aceitável. Acho que a maiora das pessoas sairão do cinema com nojo da corrupção; certeza de impotência; achando que todo classe média é maconheiro (e que todos o são pelo mesmo motivo); que todo nordestino tem "direito" de ser marginal e, claro, exaltando o Wagner Moura e o Bope. Não duvido da capacidade do filme em ser um bom - e um pouco sufocante - entretenimento.

..Ah! Já desisti há muito tempo. (;
Baccio Pam!

Cotonete disse...

gostei do texto...

Considero o filme uma coisa que vai gerar um grande pensamento conservador e fascista na sociedade brasileira, já não é o suficiente, né!? vestígios da ditadura ainda ao meu ver e como você tem um "democracia" que nasce já desgastada, cheia de vícios, acho que a critica a ação do BOPE vai ser pouca, eles vão ser vistos como os heróis que tem que cometer algum atrocidade, mas, pelo bem da sociedade. E assim caminha a humanidade... depois vou ler o texto mais uma vez, assim que não estiver com sono e passando mal

Carla R. disse...

Assisti na aula de Personalidade tb.

Achei o filme bom, não tão qto Cidade de Deus ( se é que se pode comparar ambos).
Para mim, que não conhecia nada do processo seletivo BOPE, a película foi no mínino chocante. Todavia, as relações do sistema como a terceirização do patrimônio público, o mercado de armas e drogas com as facções criminosas e, a imagem ambígua da classe média: ora financiadora de tudo, ora 'vítima' do próprio sistema; já são bem conhecidos por todos nós, por mais que tentemos ocultar esses fatos com nosso cotidiano 'insuportavelmente' certinho aos olhos da sociedade.

Mas enfim, 'Tropa de Elite' com certeza se traduz em um bom material para discussões. Entretanto, acho que as viseiras individuais só mudarão de foco até um outro filme ser colocado em cartaz nos cinemas da cidade.
Quem sabe um besteirol americano?
Isso virou rotina, lamentavelmente.
:\

Bjo Paulet Marie :*
Mto bom o texto ;)

Anônimo disse...

Que belo texto, hein?!
=)

Acho que o filme é um ótimo sacode, apesar de, particularmente, já estar um pouco imune a estas mensagens de novela e cinema brasileiro.

O Tropa de Elite peca muito ao tentar fazer do que poderia ser um filme irretocável, uma novela das oito. Ele é muito auto-explicativo e como disse a AP aí em cima, acaba por fornecer uma imagem|opinião já pronta.

No mais, temos de aprender a agir de forma consciente mesmo. E o longa prova bem que somos todos nós que financiamos e incentivamos este caos com nossos pequenos delitos.

E queria também que a vida só fosse concedida após uns bons tapas na cara. Eu desistiria com certeza. Estar vivo tem virado sinônimo de "passar aborrecimentos".

Anônimo disse...

essa guria escreve bem pra caraleo. facilmente!

ana disse...

também acho, sr. (?) anônimo.
zzzzZZZzzzZZ
mais textos, sim?

Saulo Pratti disse...

Eu gostei muito filme, mas o que eu sempre digo é que, pra mim, o mais legal do filme são as partes engraçadas, os bordões, etc. Claro que o resto todo é ótimo.